quarta-feira

História de ninguém.

Ela entrou em casa, e no grande e velho relógio de sala já passava dez minutos, das vinte e duas horas.
Após atravessar a porta branca e fria tirou os seus ténis, e descalça caminhou pé ante pé, passando pela sala onde eu estava aconchegado no meu cobertor favorito junto da lareira, esperando por ela para jantarmos.
Nem me ligou! Nem um olhar! Como se eu não existisse, como se eu não estivesse ali!
Apressada, subiu as escadas.
Segui-a lentamente, evitando fazer barulho. Parei a porta do quarto, vi-a despir-se lentamente, e seguir para a casa de banho do quarto. Ela continuava sem se aperceber da minha presença.
Continuei pela porta a espera mais algum tempo, mas cansado de esperar, entrei.
Espreitei pela fresta da porta que tinha ficado aberta, invadi a sua privacidade, invadi o seu espaço íntimo. Observei-a enquanto tomava duche, perdi-me em cada curva presente no seu corpo.
Permaneci estático a observá-la por aquele cantinho de porta aberto.
Quando, pela primeira vez desde que chegou a casa e reparou em mim, foi apenas para me dizer:
- "Que estás fazendo aí? Saii! Vai-te embora!!!"
-"Sai!!! Não te quero aqui!"
Triste, saí... Sei que não foi correcto invadir o seu espaço, mas ela não me ligou nenhuma desde que chegou! Preciso de carinho!
Não fui eu que a escolhi, muito pelo contrário!
Voltei para a sala. Deitei-me no sofá, no lugar dela.
Por ali permaneci, e passei mesmo por um breve sono, até que acordei com o cantar
do cuco do relógio, que por sinal me irrita muito. Não olhei para o relógio, mas devia ser meia noite.
Levantei-me do sofá, e dirigi-me ao seu quarto, esperando que ela estivesse mais calma, e já tivesse esquecido a embaraçosa situação do duche.
A porta estava aberta.
"Não poderia ter deixado a porta aberta, se não quisesse que fosse ter com ela..." Pensei eu.
Fui entrando.
Estava ela já deitada, meia ensonada, com os seus lindos cabelos soltos, coberta apenas com um lençol, com uma camisa de dormir extremamente sensual e decotada.
Do seu lado, velas e velinhas, espalhadas pela mesa de cabeçeira...
Subi para a cama, aproximei-me dela, procurando pelo contacto com o seu corpo quente e perfumado.
Apercebeu-se da minha presença apenas quando toquei nela.
A sua reacção, não foi aquilo que estava a espera.
Disse-me, com a sua voz ensonada:
-"Vai embora Artur... Sai... Hoje não podes ficar comigo. Vem cá ficar um amigo meu."
E empurrou-me com a sua mão para o chão, mas numa última tentativa, voltei a subir para a cama e tentei enrroscar-me nos séus pés.
De nada serviu.
Disse-me novamente:
-"Vai embora Artur... Já te disse, ficas comigo outro dia."
Desapontado, triste, saltei da cama e fui para a sala. ´
Voltei para junto da lareira, aconchegei-me no meu cobertor favorito, e por ali fiquei olhando o meu novelo de lã até adormecer...

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